Nas últimas semanas, o Brasil tem
passado por acontecimentos muito importantes para a politização de muitas
camadas sociais. A partir de um movimento pedindo a diminuição de tarifas de
transporte público em São Paulo, que foi rechaçada a partir da atuação
coercitiva do governo do mesmo estado, as pessoas começaram a se atentar em se
manifestar. Só que as pessoas não mais estavam se manifestando só por
diminuição de passagens, ou passe livre, agora estavam lutando por demandas
mais gerais, como reprovação de Projetos de Emenda Constitucionais (PEC),
contra a corrupção exacerbada, contra os gastos e transtornos e sem retornos
sociais com a copa no país, a favor da liberdade de expressão sexual, dentre
outras demandas nacionais e locais.
A proporção que estes protestos
tomaram foi muito grande, fugindo em princípio até ao controle do próprio
Estado. Isso porque através da incapacidade do Estado de impedir o
acontecimento das manifestações, da participação de grupos violentos, da
revolta geral em torno da situação acrítica em que o país passa - acrítica
porque as coisas estão acontecendo e nenhuma pessoa se movimenta para lutar.
Contudo, a grande comoção
popular, a meu ver se deu a partir da sutil se não, clara, mudança de
direcionamento dos veículos midiáticos brasileiros. Estes que, parecendo
quererem fazer uma mea culpa,
buscaram descriminalizar os movimentos sociais e transformá-los em movimentos
patrióticos, que buscam o bem comum da nação, e muitos outros discursos
prontos.
Então o movimento ganhou massa,
não sei se impulsionado pelo sentimento patriótico construído numa época de
ditadura (futebol), ou pela divulgação destes pelas mídias correntes. Porém,
essa massa, continha grupos radicais, extremistas, fundamentalistas, fascistas,
neonazistas, e muito mais grupos com ideias perigosas a sociedade.
E uma grande peculiaridade do
movimento atual foi a falta de uma grande liderança ou sequer alguma liderança
nas manifestações, levando-as a consequências totalmente imprevisíveis. Na
minha humilde opinião, uma grande ideia, porém frágil, já que sem uma
liderança, qualquer movimento social tem a possibilidade de se enfraquecer pela
falta de foco nos objetivos da luta política.
Outro aspecto importante foi o
uso das redes sociais para se organizar os protestos. Uma ideia genial, porém
frágil, já que facilmente pode ser obstruído o acesso às redes sociais em
qualquer nação do mundo.
Essas e outras informações
supracitadas, podem ser encontradas em qualquer lugar da internet, e até com
maior exatidão do que eu expus aqui.
Onde quero chegar nessa
publicação, é no lugar comum em que todos buscam sua politização. Partindo
deste pressuposto, vou falar das manifestações ocorridas em meu estado,
Espírito Santo, mais especificamente, Vitória, onde acompanhei a maior
manifestação social em sua história. Em princípio, pensei que seria uma boa
experiência, porque estava ali para representar a luta do cidadão brasileiro e
de minha classe trabalhadora. Entretanto, o que vivenciei, não foi uma grande
experiência política, um movimento social, ou manifestação; o que vivenciei foi
uma passeata, e apenas isto. Digo isso com pesar, porque minhas expectativas se
frustraram a encontrar camadas sociais que sequer são politizadas, e dentre
elas dos indivíduos que são, não concordo com seu direcionamento político. Um
movimento dito democrático, mas que odeia partidos políticos; democrático, mas
que odeia lideranças; democrático, mas violento; democrático, mas cala a voz de
quem discorda de algo; democrático, mas sem bandeira; etc. A passeata estava
até com vendedores ambulantes de bebidas alcoólicas. Aconteceu como a mídia
veiculou, uma grande festa cobrando mais direitos a população. Enfim, depois do
choque, me inseri nas brincadeiras, e até cantos de futebol foram entoados, já
que nem músicas foram criadas para o momento. O objetivo do dia era chegar a
nossa Assembleia Legislativa. Chegamos e nada! Sem objetivo fomos, chegamos, e
nesse momento encaminhei-me a minha residência, decepcionado com a falta de
consciência política no movimento.
Depois de um apanhado
superficial, chego ao ponto que eu queria: as camadas “pobres”. Estes que
sempre foram marginalizados, estigmatizados, hostilizados, excluídos dos
processos políticos, etc., passaram a participar dos movimentos. Isso também ocorreu
em estados além do meu. Essa participação alijada de consciência política
trouxe a tona o sentimento de violência e descontrole social. As pessoas pobres
de pensamento político, foram, participaram, e do mesmo modo em que se
apresentaram, saíram, sem nenhum aprendizado político, apenas a repetição de
ideias e conceitos muitas vezes, até perigosos, aparecendo até conceitos
nazistas. Os pobres de espírito, aproveitando-se da fragilidade do aparato de
controle social, realizaram saques, roubos, arrastões, e vários ataques
criminosos nas cidades em que ocorreram grandes manifestações. E os pobres
financeiramente, que reivindicam melhores condições para suas mazelas sociais.
Todavia, assisti a grupos
chamados de “grupos pequenos e isolados de vândalos” pela grande mídia, que
atacavam com ira, todo e qualquer patrimônio que avistavam. E é sobre esse
grupo especificamente que quero discutir. Assistindo pessoalmente a um desses
“movimentos”, vi um perfil totalmente diferente e que nunca antes tinha visto
em manifestações. Pessoas de classe social menos favorecida protestando. Porém,
não vi muitos entendendo a gravidade da situação. Inclusive havia muitas
crianças, adolescentes e poucos adultos representando esses grupos. E uma das
manifestações, a demonstração de revolta foi totalmente desproporcional à
situação a que se apresentava. Após ação dispersiva, muitos jovens começaram a
depredar tudo que viam pela frente, porém sem motivos políticos diretos para
tanto.
Eu vi o ódio nos olhos daqueles
cidadãos. Eu vi uma revolta sem tamanho contra um aparato coercivo; e vi a
falta de medo perante a ameaça de coerção física deste. Assisti a um
enfrentamento direto entre manifestantes e governo. Assustei-me pela primeira
vez em minha vida com a falta de politização das pessoas, que estavam fazendo o
que desejavam, mas sem motivos aparentes. E nesses motivos que não estão
aparentes que quero tentar aprofundar.
A motivação para se cometer algum
ato, nem sempre é transparente. Seguindo uma ordem crítica, percebo que a
raiva, ódio, revolta, apresentada em alguns manifestantes, remonta à muitas
outras revoltas, como na Inglaterra, no século XIX, em que trabalhadores
revoltosos quebram as máquinas em que trabalham, contra a exploração em que viviam.
Alio esse pensamento à revolta dos manifestantes exacerbadamente violentos, e
sem motivos aparentes. Eu penso na revolta contra a opressão social em que
vivem, na qual a violência se tornou banal, os recursos escassos são comuns, e
a falta de segurança geral é constante, a educação é precária, a saúde
inexiste, e o saneamento básico muito menos, dentre outras ausências e faltas
que o Estado não consegue e não quer suprir. Eu enxergo um desespero social em
lutar pela sobrevivência, lutar por melhores condições de vida, ou até mesmo
buscar um lazer deturpado no embate com a polícia. Eu vi pessoas tolidas de
muitos caracteres de um cidadão autônomo e consciente da situação em que vive.
Mas vi também pessoas aliadas a uma luta contra a exclusão em que vivem. Então
infiro que apesar da violência desses grupos radicais, radicalizados, e até
infiltrados, são reflexos da grandiosidade dos movimentos sociais que estão
ocorrendo nas últimas semanas. Que possuem tamanha magnitude que atingiu a
consciência das camadas menos abastadas da sociedade. Camadas que já não lutam
só contra corrupção, reforma política, menos tributos, etc., mas lutam por
direitos básicos, que não lhe são disponibilizados.
Excluindo os criminosos que se
aproveitam da precariedade do aparato de segurança, que prioriza a coerção de
protestos em detrimento da segurança geral, todos os cidadãos tem que exercer
seus direitos, e todos devem aproveitar o momento para se politizar. O
vandalismo sem objetivo é apenas depredação de algo, mas também é uma revolta
contra uma sociedade que não representa essas pessoas.
Por fim, a sociedade brasileira
passa por um amadurecimento político que deve ser canalizado para a construção
de uma autonomia do ato de pensar dos indivíduos. Todos devem ser reconhecidos, e dados seus
espaços e suas análises de como protestam, porque protesto, para que protestam
e para quem protestam. E as camadas sociais antes excluídas até dos processos
políticos, devem ser incluídas para que também se politizem e que suas demandas
sociais também sejam ouvidas, e assim se construir uma democratização de suas
realidades e suas mazelas.
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